Foi com este título que o semanário Sol do passado Sábado informava que o Governo defende o recurso a serviços jurídicos externos e a contratação de empresas privadas para o processamento das contra-ordenações em regime de outsourcing.
A Direcção-Geral de Viação foi extinta e parte das suas atribuições serão desenvolvidas, a partir de amanhã, quarta-feira, pela Autoridade Nacional de Segurança Rodoviária e pelo Instituto da Mobilidade e Transportes Terrestres (do Ministério das Obras Públicas que integra, na sua totalidade, as atribuições e competências da Direcção-Geral dos Transportes Terrestres e Fluviais, do Instituto Nacional do Transporte Ferroviário e assume, em matéria de veículos e de condutores, as atribuições que têm vindo a ser exercidas pela Direcção-Geral de Viação, entidade tutelada pelo Ministério da Administração Interna) cuja lei orgânica -D.L. n.° 147/2007 de 27-4 - foi publicada na passada sexta-feira.
Este Instituto passará a emitir as cartas de condução, a fiscalizar as homologações de veículos e dos serviços de fiscalização periódica.
As polícias assumirão mais responsabilidades: audição de testemunhas, apreensão guarda e devolução de documentos.
Como se verifica, todo este processo, que envolve cerca de 1100 funcionários, tem estado envolto em algum secretismo.
Estranhamente, a notícia do «Sol», repetida nalguns noticiários da TSF, quase não teve repercussão.
Dizemos estranhamente porque:
- Os tais privados passarão a desempenhar funções eminentemente públicas, próprias do exercício da soberania e do poder coactivo do estado, o que é totalmente inaceitável. Trata-se de mais um exemplo neste desvario que confunde e mistura funções do estado com o público e o privado e que denunciámos aqui.
- As tais empresas privadas e os seus funcionários passarão a dispor de um grande poder sobre os cidadãos e estarão sujeitas(os) a pressões e a tráfico de influências - no sentido fecharem os olhos, de processarem multas mais brandas, de demorarem/esquecerem/extraviarem processos, ou mesmo de cometerem ilegalidades bem mais graves, v.g. notícias recentes acerca da corrupção na GNR e seus mecanismos -, de fiscalização ainda muito mais complicada e ineficaz;
- Os seus erros e omissões, de entidades privadas, poderão responsabilizar o estado e afectarão a sua credibilidade;
- Podem estar a preparar-se negociatas, com os tais privados, à custa do interesse e do erário públicos;
- As polícias ver-se-ão assoberbadas por um enorme acréscimo de trabalho, burocrático, para o qual não estão preparadas nem vocacionadas. Para que o mesmo seja feito, provavelmente, serão retirados polícias da rua, contradizendo os esforços, que tem ido no sentido correcto, de aliviar as tarefas administrativas em ordem a mantê-las na rua, onde são mais úteis e necessárias.
- As polícias, que ouvirão as testemunhas e que tratarão dos processos de contra-ordenação de trânsito, serão as mesmas que reprimem as infracções e que levantam os autos? Poderá o agente autuante inquirir as testemunhas em sede de instrução do processo? Nesse caso as garantias de defesa serão inexistentes e a solução acabará por suscitar problemas de constitucionalidade.
Trata-se de um caso extremo de desjudicialização da administração da justiça: De recordar que, há alguns anos atrás, o julgamento das violações ao Código da Estrada foi (através de uma então muito contestada medida legislativa, que transformou as então contravenções em contra-ordenações) retirado dos Tribunais e entregue a uma entidadade administrativa. Agora, pelos vistos, tal julgamento é entregue, na prática, a «empresas privadas».
Bem andou o IGAI que, cheio de bom senso, alertou para os riscos do outsourcing: «desresponsabilização dos funcionários e queda de confidencialidade dos registos dos condutores»!
- Finalmente, julgamos que a Ordem dos Advogados terá algo a dizer, quer esteja em causa a contratação de sociedades de advogados (que não são propriamente empresas privadas no sentido vulgar do termo) para este serviço, quer esteja em causa, principalmente, a anunciada contratação de «empresas privadas», na medida em que, nesse caso, poderão estar em causa actos próprios do advogado.
terça-feira, 1 de maio de 2007
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1 comentário:
É o país que temos é o Ministério da justiça que temos (o pormenor da letra minúscula não é gralha) e é, de facto, o desvario total na administração da Justiça. Parece que estes senhores se esqueceram da Constituição, assim como os srs magistrados. Isto não é nenhum estado de Direito é um Estado cada vez mais Totalitarista, ou com tendência totalitaristas, governados por alguém que se apresenta como algo que não é título dado por uma Universidade dos "amigos". Não está em causa ser Eng. ou não o que está em causa é ter mentido sobre isso.
mas agora vamos ver quais são as empresas de outsorsing que vão processar as multas. Vão ser dos "amigos" ou multinacionais, com todos os riscos que disso advêm. E o direito de defesa do cidadão, ficam onde? Recorre-se de tudo é? E isso não vai, de novo entupir os Tribunais? Será que estes Srs. alguma vez entraram num Tribunal ou só vêm estatísticas falseadas.
Enfim ... E a Ordem dos Advogados ...
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